Monday, May 31, 2004

capitulo 1 ( continuação 5)

«Levantou-se, beijou a mão do amo e saiu da sala tendo como destino a cave.»


Evolução de Miguel Albuquerque
Montagem feita por Danilo Fernandes

Vinte anos se passaram. A casa dos Albuquerque vivia o seu periodo dourado. O Barão e Conde de Mangualde era Governador da Região.
Era respeitado pelo povo, embora lhe criticassem uma atitude severa.
Os mesmos do Clube da cidade, entretanto transformado em grande entreposto comercial, invejavam-no.
Sobre Alexandre caiam boatos acerca de infidelidades à sua “santa esposa” Maria Lúcia, sobre maus tratos de criados entre outras coisas inventadas pela falta de escrupulo moral daqueles que cobiçam o alheio.
Nada que preocupasse o Conde, que por uma coisa era intocavel: o amor pelo filho.
Miguel era então um jovem admirado. Terminara os estudos com sucesso. Aliado à sua educação, o seu distinto porte fisico faziam dele um perfeito gentleman.
Era normal as meninas ricas ficarem fascinadas quando por elas passava aos Domingos nas artérias da cidade.Se as mirava, com os seus olhos verdes, tinham um principio de desmaio, porém questionava-se se não seria a sua condição social a causadora de tamanha admiração.Mas este pensamento era como o vento: passava e poucas marcas deixava.
Miguel era feliz. Os pais adoravam-no. A Mãe era a sua companheira e confidente.
Ora um dia a felicidade acabou. Os Albuquerque iam deixar a sua casa. A razão era a oferta de um cargo de Governador de uma provincia do interior que se encontrava com problemas: lutas e manifestações.. Miguel sentiu-se desgostoso quando soube que ia parar a outra cidade.
Mas não era esse o único desgosto a consumi-lo.
Os seus pais queriam que se casasse com uma rapariga filha de uma rica familia da região. Por respeito pelos pais, Miguel aceitou.
Mas no seu intimo, sentia a revolta crescer.
Começaram, então, os preparativos da boda.Miguel enfadara-se com isso.
Queria ser livre. Descobrir a mulher da sua vida, por si e não imposta por ordens externas.
No entanto, por ordem dos pais e conselho de Joaquim, acatou as decisões sem nada dizer.
Numa bela manhã de Outono a casa dos Albuquerque encerrou. Partiram numa jornada de quatro dias para a sua nova residência. Para além dos novos criados, a família não dispensara os cuidados de Joaquim, o grande amigo e aio de Miguel…
O dia da Boda chegou. A Igreja engalanou-se de flores para celebrar o casamento do filho do Governador e da filha da familia mais rica da região.
Os convidados todos de estatuto social elevado, sorriam. Miguel estava no altar, imóvel.
De repente, o orgão tocou música festiva. A noiva aproximava-se. O seu rosto estava coberto com um véu. Miguel via-a aproximar-se angustiado. Será feia, será bonita? Simpática?
As dúvidas percorriam-lhe o pensamento. Rápidas e perigosas.
Da noiva, sabia que se chamava Ana, mais nada.
A noiva retirou o véu. Miguel, ansioso, olhou para ela.

Wednesday, May 26, 2004

Capítulo I (continuação - 4)

«Meu Deus, meu Deus… faz com que a criança sobreviva.»

Estas preces pareceram surtir efeito. Os gritos diminuiram.A cozinheira passou apressada com os panos brancos lavados e entrou, a correr, no quarto. Passado um momento saía de novo. Vinha a sorrir. Sorriso de quem cumpriu a sua missão. Alexandre e Joaquim aproximaram-se. O Barão falou-lhe então.
- Fala mulher! Que motivos há para essa tua alegria?
- É um menino senhor Barão. – disse a cozinheira mexendo os panos alegremente.
Alexandre não se conseguiu controlar e pediu para o filho ver. Ali, com o filho nos braços tudo lhe parecia diferente. Era o seu filho que segurava. A sua descendencia, o seu orgulho. Aquele ser que o manteria vivo, perpetuado por toda a eternidade, muito para além da morte.
Era loiro, tinha a pele clara...como um verdadeiro princípe. Pensou Joaquim.
- E está de saúde?
- Parece-nos que nasceu são. – É pesado o menino.
Ao ouvir estas novas o Barão não conseguiu conter uma lágrima furtiva.
Mas rapidamente a limpou. Deu ordens aos criados para que cuidassem da criança como um príncipe. Depois mandou Joaquim segui-lo até ao andar de cima. Viarando-se ele no salão onde se reunia em festas da alta roda da cidade, pediu a Joaquim que lhe arranjasse um conhaque.
Depois do criado lhe trazer a bebida o Barão convidou-o a sentar-se num sofá próximo dele.
- Joaquim. Meu criado. Meu amigo. Não te esqueças do que há pouco te pedi. Cumpre isso com cuidado, não vá ninguém saber do segredo.
Passa esta mensagem aos criados e diz-lhes para se calarem para o resto da vida. Quanto à criança, meu filho, quero que sejas o seu aio. O homem que o proteja e a ele esteja atento. Não te esqueças Joaquim.
Ele não é uma criança qualquer…Ele é Miguel Meireles de Almeida e Albuquerque. Meu filho varão e de tua senhora também.
Descendente de nobres linhagens europeias. Entendeste Joaquim?
O criado durante uns momentos não respondeu. Adaptara-se intimamente a esta realidade. Olhando fixamente o Barão, acabava por responder convictamente: Percebi.
Levantou-se, beijou a mão do amo e saiu da sala tendo como destino a cave.

Miguel Albuquerque

Capítulo (continuação - 3)

- Ainda não meu amo. O parto está difícil…

Ao ouvir estas palavras o Barão tremeu. Teve mesmo que a um velho bengaleiro sem verniz se encostar, que servia para pendurar o casaco dos criados. Joaquim apercebeu-se e suavemente lhe pousou a mão no ombro. Alexandre, passados breves momentos, retomou a pose altiva que tanto o caracterizava. Com voz suave mas autoritária falou ao criado:
- Joaquim, em ti confio muita coisa. Embora de classes sociais diferentes sejamos, embora eu seja patrão e tu criado, o que agora te vou dizer e pedir será algo que esquece as nossas raízes. Que as ultrapassa. Estás ao corrente de tudo o que aconteceu este ano. Chegaste a levar-me de coche a casa de Clarisse nas frias noites de fevereiro e nada divulgaste a ninguém que eu bem sei. Nunca te perguntei o que pensavas. Eu sei, e sempre soube, o que faço. Também amanhã sei o que farei. Por isso escuta o que te vou ordenar. Melhor. Não te ordeno. Peço. E é o seguinte: amanhã, depois do parto, fazes desaparecer Clarisse. Não quero saber mais dela. Quer a criança viva ou morra. Tomei uma decisão que não alterarei. E bem sabes que as minhas decisões não altero. Serei sempre, a partir de agora, fiel à minha esposa. Mesmo que ela filhos não me possa dar. Se esta criança sobreviver tratá-la-ei como filho que de mim e da minha mulher fosse. Quero que propagues a notícia de que minha esposa é sua mãe. Se a criança falecer, peço-te que arranjes força para tudo esquecer., e também te digo…
Nesse momento um grito do quarto ao fundo do corredor a casa percorreu. Um grito de profunda angústia. De mulher que sofre para à terra um filho oferecer. O Barão e Joaquim entreolharam-se. Um espanto sentiram. Ao homem não é permitido conhecer as dores pelas mulheres sofridas. As suas penas para trazerem um ser humano ao mundo, talvez o que de mais encantador há. Uma criada do quarto saíu apressada. Mas ao ver ali o seu amo estacou assustada. Alexandre quase lhe berrou, nervoso:
- Fala mulher. O que está a acontecer?
Depois de breves momentos em silêncio, assustada com a presença do amo, a criada gaguejou:
- Está difícil o parto. Clarisse sofre bastante. E já lhe atacou a febre. Pobre mulher… se me permite meu amo, vou buscar mais água a ferver à cozinha – e sumiu-se apressadamente.
Entretanto os gritos aumentavam. A agonia parecia atingir o seu máximo. Outra criada saía com trapos ensaguentados do quarto. E dirigia-se também à cozinha sem em Alexandre reparar. A outra criada passou com a bacia de água a ferver. O Barão e Joaquim olharam para esse rebuliço. Estavam também horrorizados pela sinfonia de gritos que o corredor escuro abalava. Alexandre travou do braço de Joaquim. Baixou a cabeça e sussurou: «Meu Deus, meu Deus… faz com que a criança sobreviva.»


Joaquim, o fiel criado

Thursday, May 20, 2004

I Capítulo (continuação - 2)

- Chegou o dia…
– esta frase pareceu a Alexandre uma fatalidade.
- Leste o bilhete que à entrada se encontrava? Não me digas que sabes o que está a acontecer?
- Mais do que julgas. Não li bilhete nenhum. Mas sei que o teu filho está a nascer. Tudo providenciei para que nasça como um príncipe. Dei ordens a todos os criados para ao parto ajudarem.
- Filho meu… que teu também será.
- Não! – neste momento as lágrimas voltaram a correr na face de Maria Lúcia – Não saiu de mim – disse a soluçar. Aceito-o pois o meu amor por ti é mais forte que a vontade de revolta. Amo-te e por ti as montanhas moveria. Até os momentos em que te encontravas com essa megera aguentei.
- Quando aquela ideia tive, pensei que a tinhas sem reservas aceite.
- Apenas pelo puro amor. Se estéril nasci, como o provam os quatro anos que se passaram desde o casamento sem um filho ao mundo oferecer. Talvez castigo de Deus seja. Talvez o melhor fora esta ideia não se ter concretizado. Não sei se filho dessa mulher posso eu aceitar como meu. Não sei se estou pronta para fingir-me mãe de um filho que não saiu de meu ventre.
- Mais discussão não vale a pena – disse o Barão resignado. Sei que sofreste por me amares. Por isso, quero que também tenhas a certeza do seguinte: amanhã Clarisse desaparecerá desta terra. O menino receberá o nosso nome, Almeida de Albuquerque. E quero que sejas a mãe dele. E que para todo o sempre assim hajas.
- Terei que mentir até à sepultura? Não sei se esse pecado poderei aguentar.
- Fá-lo por mim!
- A dedicação e respeito que me mereces então isso me mandam. Vai! Vai ver o nosso filho.
A seguir a estas palavras, Maria Lúcia desatou num infantil pranto. Alexandre com ela queria ficar. Porém, o desejo de saber novas do parto ardia-lhe no peito. Abraçou então a esposa. Beijou-a na testa. Saio. Velozmente percorreu as escadas em direcção à cave. Ao fundo do último lanço de escadas encontrou Joaquim. O criado predilecto:
- Que novas me dás Joaquim? Clarisse já deu à luz?
- Ainda não meu amo. O parto está difícil...


Alexandre e Maria Lúcia

Wednesday, May 19, 2004

I Capítulo (continuação)

«Chegou o dia. Estou cá em casa. Quarto das empregadas…»
Alexandre, por momentos, ficou imóvel. Assaltara-o o espanto. «Chegou o dia…». A frase ressoava na cabeça. Sabia que este «hoje» chegaria. Mas não esperava que tão cedo fosse. Depois de mais de um minuto parado, o Barão reagiu freneticamente ao bilhete. Em mil pedaços o rasgou, atirando-os em seguida para o chão. Pegou na sineta que usava para os empregados chamar e o servirem obedientemente em cada seu regresso a casa. Violentamente a vibrou. Esperou poucos segundos. Voltou a tocá-la. Ninguém vinha, e nenhuns passos se apercebiam nos corredores da escura casa. Ansioso, Alexandre lançou-se em corrida pelas escadas acima. As escadas que davam ao seu quarto onde, como dono e senhor da casa, dormia acompanhado de sua esposa. No entanto, ao chegar ao último lanço de escadas, estacou. Reflectiu então sobre o porquê de ter ido na direcção contrária ao acontecimento que naquele estado de nervos o pusera. A resposta surgiu-lhe numa visão: a de sua mulher. Como estaria ela naquele momento? Nos últimos dias não saia do quarto. Pouco comia. O seu estado de fraqueza de manhã em manhã se alterava para pior. E Alexandre pelo estado de saúde de sua cara-metade culpado se sentia. Não queria, devido a um desejo que era como um mandamento da honra de distinto cavalheiro que era, perder alguém que tanto amava. Do quarto se acercou. Abriu, devagar, a pesada porta barroca. A janela estava aberta. Embora ténue, uma certa luminosidade cinzenta o quarto invadia. Olhou para a cama e não viu aí a esposa, algo raro nos últimos tempos. Assustou-se. Mas rapidamente pôde respirar de alívio. Do outro lado do quarto, no canapé vermelho distinguiu a silhueta de Maria Lúcia. Dela se acercou devagar. Não sabia o que dizer. Queria-lhe perguntar como se sentia, mas algo na garganta lhe travava o som. Maria Lúcia tinha os olhos vermelhos. Mas estava calma. Iniciou ela o diálogo. Uma estranha conversa entre marido e mulher:
- Chegou o dia…


Maria Lúcia

I Capítulo Numa noite de tempestade…

Esta é uma história de vida. Uma história sobre pessoas que muito mudaram o corrompido mundo em que vivemos. Uma história de sentimentos. Uma história de lugares e de indivíduos que ousaram acreditar que os Homens são mais que simples Homens. Porque mais forte que a vitória, só a glória que ela encerra. Senta-te. A história é longa. Tens muito que ouvir. Não será uma perda de tempo. Antes, depois de esta lição entenderes, poderás saber como melhor perceber o tempo... - ternamente falou assim a voz, antes de fazer uma pausa e começar a maravilhosa jornada que jamais se ouviu.

Novembro. Tarde chuvosa. Uma tempestade tropical assombra a pequena cidade de Mangualde, capital de Sauzesco.
Quando chovia, os familiares da cidadezinha fechavam-se em casa. Os homens corriam para o clube e permaneciam lá durante horas. Durante esse tempo, Mangualde era uma cidade fantasma.
O clube oferecia a paz de um recanto estilo francês, acolhedor. As suas paredes de madeira de carvalho e os sofás já gastos eram os grandes testemunhos do reboliço que se passava por lá. Sentados perto do reconfortante calor da lareira, com o charuto e o copo de brandy na mão, os homens da cidade falavam de tudo. Durante as longas partidas de bilhar lavavam-se as almas e jogavam-se opiniões como se aquele local fosse um confessionário de emoções.
O Barão Alexandre de Albuquerque, também conde de Mangualde, saía de mais uma conversa com os seus ilustres amigos. As horas tinham passado como flechas apressadas e precisava voltar para casa. Agitado, percorreu as ruas desertas, olhando para as luzes acesas dentro das casas. Girando a sua bengala companheira para a frente e para trás, com o seu chapéu de coco na cabeça, olhou para o farol iluminado e viu os barcos que ondulavam no mar. Por sorte, a tempestade estava para acabar, pensou.
Abriu a porta de casa, sentiu o calor, o crepitar da lareira. Pousou o chapéu no bengaleiro. Em seguida olhou para a pequena mesa de entrada e viu, sobre o lindo nepron dourado, um recado: «chegou o dia. Estou cá em casa. Quarto das empregadas…»


Barão Alexandre de Albuquerque

Tuesday, May 18, 2004

Introdução



Esta é uma história de vida. Uma história sobre pessoas que muito mudaram o corrompido mundo em que vivemos. Uma história de sentimentos. Uma história de lugares e de indivíduos que ousaram acreditar que os Homens são mais que simples Homens. Porque mais forte que a vitória, só a glória que ela encerra.